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Bernard Soulier

 

Viver com Bernard Soulier
Marta Pereira, 25 anos, entrou nas urgências do Hospital Garcia de Orta, em Almada, com uma anemia grave, que lhe valeu três dias de internamento e uma transfusão de sangue. Desde que convive com o Síndroma de Bernard Soulier, uma doença rara, Marta já se habituou ao cansaço físico, ao fluxo intenso da menstruação que dura oito dias, mesmo com a ajuda da pílula e ao facto de não poder tomar certos tipos de medicamentos.

Mas no dia em que, por não ter tomado a medicação como devia, foi de urgência para o hospital, esta estudante universitária, percebeu que conviver com a doença não era assim tão fácil. Mesmo que as limitações se baseiem na “proibição” de fazer exercício físico intenso e nos exames médicos de seis em seis meses.

Gabriel Tamagnini, director do serviço de Hematologia do Hospital dos Covões, em Coimbra, foi um dos médicos a quem Marta recorreu para confirmar se era portadora de Bernard Soulier. Passados quase cinco anos dessa visita, Tamagnini revela que “houve grandes evoluções no diagnóstico desta doença”. Os testes de laboratório mais eficazes e os avanços da biologia molecular permitiram diagnosticar melhor e discriminar outras patologias semelhantes.

Características
“A Bernard Soulier é um doença hereditária, autosómica recessiva”, explica Tamagnini. Isto significa que o pai e a mãe possuem um defeito que não tem expressão, mas cuja combinação faz com que o filho tenha a doença. “Daí resulta uma plaqueta com défice de um receptor na superfície que não funciona como deve de ser”, explica Gabriel Tamagnini. As plaquetas sanguíneas são formadas a partir de células da medula óssea (os megacariócitos) e desempenham um papel muito importante na coagulação sanguínea. Quando, por exemplo, ocorre o corte de um vaso sanguíneo, o sangue sai para o exterior e a coagulação ocorre num espaço de três a cinco minutos.

As plaquetas dos doentes com Bernard Soulier não têm um aspecto normal. “São plaquetas gigantes, que aparentemente se podem confundir com outro tipo de células, mas possuem certas características laboratoriais que permitem o diagnóstico”, explica por seu turno Teresa Fidalgo, Técnica Superior na área de Hemostase.

Quando a célula não funciona bem, há situações hemorrágicas, mais ou menos graves. Segundo Gabriel Tamagnini, manifestam-se normalmente nos primeiros anos de vida, com “hemorragias exuberantes quando rebentam os dentes” ou, no caso das mulheres, no primeiro período menstrual. “Nos homens manifesta-se normalmente na primeira fractura, na primeira intervenção cirúrgica ou ferida mais profunda. Comportam-se quase como hemofílicos: sangram muito”, continua este especialista.

Diagnóstico
Marta detectou a doença por acaso. “Era para ter feito uma operação aos ouvidos quando tinha 13 anos. Fiz as análises de preparação para a cirurgia e foi detectada uma anomalia nas plaquetas”, conta. Nessa altura, todos os membros da família fizeram exames e não se sabia ao certo que doença seria. Marta e a irmã, Inês, são as únicas portadoras da doença, num total de quatro irmãos.

“Normalmente essas pessoas são filhos de casais consanguíneos”, revela Teresa Fidalgo. Mas no caso da Marta esta hipótese é posta de lado. Pai e mãe não têm familiares em comum. Marta acredita que talvez sejam de descendência judia, já que estes povos, tradicionalmente fechados, tendem a casar entre si.

A doença foi descrita em 1948 por Bernard e Soulier, depois de observarem um jovem com uma grave e prolongada hemorragia, provocada pela diminuição do número de plaquetas no sangue (trombocitopénia). As plaquetas eram de um tamanho exagerado.

A prevalência desta doença rara é difícil de calcular, mas é provável que afecte um doente num milhão. Nos Hospital dos Covões, por exemplo, a equipa de Hematologia, está a seguir dois casos.

Tratamento
Como se trata de uma lesão hereditária, não se pode falar em cura. “Existem substâncias no mercado que fazem reduzir substancialmente as percas hemorrágicas (o Epsicaprom, por exemplo). Nas situações de hemorragias extremas há outras alternativas, mas que só podem ser usadas em casos muito graves e em hospitais que tenham recursos muito sofisticados”, afirma Gabriel Tamagnini.

Mas mesmo com algumas preocupações diárias, Marta convive com a doença de uma forma natural e desdramatiza o “susto” que apanhou devido ao descontrole de medicamentos. E se um dia quiser vir a ter filhos, Gabriel Tamagnini sossega-a: “Por razões que nos escapam, a tendência hemorrágica tende a diminuir durante a gravidez”.

O que está em causa numa doença com estas característica é o diagnóstico correcto. “Há uma série de outras doenças que têm manifestações muito parecidas e que não são Bernard Soulier”, avisa este especialista referindo-se à Trombastenia de Glanzmann, dez vezes mais frequente. Esta doença caracteriza-se pela existência de hemorragias cutâneas e das mucosas, devido a uma alteração da função das plaquetas, com deficiente aglutinação.

E conclui: “O nível de consanguinidade em Portugal é consideravelmente maior do que nos outros países da Europa, de modo que há muitas doenças raras, recessivas, como a de Bernard Soulier ou de Gaucher, frequentes no nosso País. O que tem piada é que a grande maioria dessas doenças tem tendência a ser extraordinariamente benigna... são os brandos costumes!”.