Problemática das doenças raras
Doenças raras são aquelas que ocorrem
com pouca frequência ou raramente na população em geral. Para as pessoas com doenças raras, esta raridade tem muitas consequências
desfavoráveis, tanto médicas como sociais.
Médicas: foram feitos poucos estudos destas patologias severas
o que, muitas vezes, põe a vida dos doentes em risco. Por se saber tão pouco acerca da maioria das doenças raras, o diagnóstico
preciso, se feito, é feito tardiamente.
Sociais: a comunidade médica sabe relativamente pouco sobre as
doenças raras e, como resultado, geralmente o sistema público de saúde dá uma cobertura inadequada. A falta de tratamento
eficaz deve-se tanto à escassez de investigação, como ao facto do desenvolvimento de medicamentos para um número limitado
de doentes não ser lucrativo comercialmente.
Raro: definição e paradoxo
Doenças raras são aquelas que afectam um
número limitado de pessoas de entre a população total, definido como menos de uma em cada 2000. Apesar deste número parecer
pequeno, traduz-se em aproximadamente 200000 indivíduos quando se considera a UE no seu tamanho actual de 15 Estados Membros,
e 230000 quando a Comunidade se expandir ficando com 25 Estados Membros. A maioria das pessoas representadas por estas estatísticas
sofrem de doenças que ocorrem com menos frequência, afectando uma em cada 100000 pessoas ou menos.
Estima-se que hoje existam
entre 5000 e 8000 doenças raras distintas, afectando entre 6% e 8% da população total, noutras palavras, entre 24 e 36 milhões
de pessoas na Comunidade Europeia - equivalente à população conjunta da Holanda, Bélgica e Luxemburgo.
Semelhanças e diferenças nas doenças raras
Semelhanças
Devido à sua raridade, apenas as patologias severas foram
distinguidas como doenças raras. Estas doenças podem ser caracterizadas quase sempre como:
doenças crónicas sérias, degenerativas e que normalmente colocam a vida em risco;
doenças incapacitantes, em que a qualidade de vida é comprometida devido à falta de autonomia;
doenças em que o nível de dor e de sofrimento do indivíduo e da sua família é elevado;
doenças para as quais não existe uma cura efectiva, mas os sintomas podem ser tratados para melhorar a qualidade
de vida e a experança de vida.
Diferenças
80% das doenças raras têm origem genética identificada. Estas
dizem respeito a entre 3% e 4% dos nascimentos. Outras doenças raras resultam de infecções (bacterianas ou virais) e alergias
ou são devidas a causas degenerativas e que proliferam.
Os sintomas de algumas doenças raras podem aparecer à nascença
ou na infância, como no caso da atrofia muscular espinal infantil, da neurofibromatose, da osteogenese imperfeita, das doenças
do armazenamento lisossomal, da condrodisplasia e do síndroma de Rett. Muitas outras, como a doença de Huntington, a doença
de Chron, a doença de Charcot-Marie-Tooth, a esclerose amiotrófica lateral, o sarcoma de Kaposi e o cancro da tiróide, só
aparecem na idade adulta.
As doenças raras caracterizam-se pela ampla diversidade de distúrbios e sintomas que apresentam
e variam não só de doença para doença, mas também de doente para doente que sofra da mesma doença.
Doenças raras: um novo conceito de saúde pública
O fenómeno de dar atenção
às doenças raras é recente. Até há pouco tempo, os sistemas de saúde e as políticas publicas ignoram-nas largamente.
Algumas
doenças raras específicas são muito conhecidas. Nos casos em que está disponível um tratamento preventivo simples e eficaz,
foram rastreadas como parte da política de saúde pública.
Hoje percebe-se melhor as razões pelas quais as doenças raras
como um todo foram ignoradas por tanto tempo.
Claramente é impossível desenvolver uma política de saúde pública específica
para cada doença rara. Assim, uma abordagem global ao invés de uma abordagem fragmentada pode trazer soluções. Uma abordagem
global das doenças raras permite que uma doença individual saia do anonimato e sejam estabelecidas políticas de saúde pública
nas áreas de investigação científica e biomédica, investigação e desenvolvimento de medicamentos, política da indústria, informação
e formação, benefícios sociais, hospitalização e consultas externas.
Doenças raras: falta de conhecimento e de sensibilização do público
O
conhecimento médico e científico acerca de doenças raras é escasso. O número de publicações científicas sobre doenças raras
continua a aumentar, em particular aquelas que identificam novos sindromas, no entanto apenas menos de 1000 doenças, essencialmente
aquelas que ocorrem mais frequentemente, beneficiam de um conhecimento mínimo. A aquisição e a difusão do conhecimento científico
é a base vital para a identificação das doenças e, ainda mais importante, para a investigação de novos procedimentos de diagnóstico
e terapêuticos.
Facilmente descuradas por médicos, investigadores e políticos, apenas as doenças raras que atraiam a atenção
do público beneficiam de uma política de investigação pública e/ou assistência médica. Normalmente são as associações e os
grupos profissionais que fazem a consciencialização do público. O progresso feito no tratamento destas doenças permite àqueles
que sofrem delas viver melhor e durante mais tempo, tendo como resultado maior sensibilização da opinião pública acerca da
doença.
Doenças raras: factores de exclusão
Quase todas as pessoas com uma doença
rara encontram os mesmos problemas: atraso e falha no diagnóstico, falta de informação acerca da doença, falta de referências
para profissionais qualificados, falta de disponibilidade de cuidados com qualidade e de benefícios sociais, fraca coordenação
dos cuidados de internamento e de consulta externa, autonomia reduzida, e dificuldade na reintegração no mundo do trabalho
e ambientes social e familiar.
Muitas doenças raras envolvem insuficiências sensoriais, motoras, mentais ou físicas. As
pessoas afectadas pelas doenças raras são mais vulneráveis psicológica, social, cultural e economicamente. Obviamente, estas
dificuldades podem ser reduzidas através da implementação de políticas públicas apropriadas.
Em muitos casos as doenças
raras não são diagnosticadas devido à escassez de conhecimento científico e médico. Na melhor das hipóteses, alguns dos sintomas
são reconhecidos e tratados. As pessoas podem viver anos a fio em situações precárias sem cuidados médicos competentes uma
vez que estão excluídos do sistema de cuidados de saúde com uma doença não diagnosticada.
O grau de conhecimento de uma
doença rara determina tanto a rapidez com que é diagnosticada como a qualidade das coberturas médica e social. A percepção
do doente da sua qualidade de vida está mais ligada à qualidade dos cuidados do que à gravidade da doença ou ao grau das deficiências
associadas.
Doenças raras: sistemas públicos de saúde e cuidados de saúde inadequados
Todos
aqueles que sofrem de doenças raras e respectivas famílias falam da luta para serem ouvidos, informados e dirigidos a corpos
médicos competentes, quando estes existem, por forma a serem correctamente diagnosticados. Como resultado, há atrasos sem
sentido, múltiplas consultas médicas e prescrição de medicamentos e tratamento impróprios ou mesmo perigosos para a saúde.
Apesar
do progresso feito ao longo dos últimos dez anos, acontece muitas vezes o diagnóstico de uma doença rara ser deficientemente
comunicado. Muitos doentes e respectivas famílias descrevem a forma insensível e pouco informativa como o diagnóstico inicial
é dado. Este problema é comum entre os médicos, que não estão organizados nem treinados em boas práticas de comunicação de
diagnósticos. Após o diagnóstico, os doentes e respectivas famílias referem casos de cuidados seriamente desadequados.
Não
existe qualquer protocolo para a boa prática clínica para a vasta maioria das doenças raras. Nos casos em que tal protocolo
existe, este conhecimento permanece isolado quando devia ser partilhado. Para além deste facto, a segmentação das especialidades
médicas é uma barreira para o cuidado global de uma pessoa com uma doença rara.
As famílias e os profissionais de saúde
queixam-se frequentemente da dificuldade extrema em dar os passos administrativos necessários para receber benefícios sociais.
Existem disparidades grandes e arbitrárias na atribuição da ajuda financeira e do reembolso de custos médicos de país para
país e mesmo regionalmente dentro de alguns países. O custo dos tratamentos é muitas vezes mais elevado que o dos tratamentos
das outras doenças devido à raridade da doença e ao número limitado de centros especializados. Uma parte significativa destas
despesas é suportada pelas famílias.
Para algumas doenças raras, como a febre Mediterrânea familiar, o síndroma do X frágil
e a fibrose quística, já existem protocolos de tratamento e programas médicos, sociais e educacionais definidos nalguns países,
assim como programas de rastreio mais ou menos bem dirigidos.
Estes novos métodos pré-natal e rastreio em fase assintomática
para as doenças raras permitem que seja feita uma cobertura médica efectiva mais cedo, melhorando significativamente a qualidade
e o tempo de vida. Outros programas de rastreio devem ser introduzidos mal existam testes fiáveis e tratamentos eficazes.
O progresso qualitativo e quantitativo no prognóstico e no tratamento clínico está a levantar novas questões de saúde pública
acerca das políticas de rastreio generalizado e direccionado de algumas doenças.
Doenças raras: desde a perda da esperança de tratamento até ao ponto em que os doentes
se encarregam do assunto
Há uma grande esperança no progresso científico e terapêutico. Deles se espera também
uma mudança profunda. No entanto, para as doenças raras actualmente:
não há um número suficiente de programas de investigação públicos
os medicamentos desenvolvidos para tratar pequenos números de doentes permanece muito limitado.
As doenças
raras, ainda mais do que as outras doenças crónicas, caracterizam-se pelo facto dos doentes e as suas famílias serem muito
pró-activos já que muitas vezes:
conhecem a sua doença e as suas particularidades tão bem como os profissionais
tratam do seu próprio tratamento.
As organizações de doenças raras foram criadas como resultado da experiência
ganha pelos doentes e respectivas famílias ao serem tantas vezes excluídos dos sistemas de saúde, tendo que tomar conta da
sua própria doença.
Para além da sua vocação de tornar as doenças raras mais conhecidas pelo mundo médico e pela sociedade
em geral, estas organizações são um bom meio para partilhar experiência e disseminar informação. O seu envolvimento nos cuidados
diários faz com que seja natural a continuidade numa contribuição activa para o progresso terapêutico, desde a colaboração
em testes clínicos à criação de centros de tratamento integrado.